Por Isaac Guerreiro

Jogos são feitos com vários braços. São desenvolvedores, game designers, roteristas e músicos trabalhando juntos pra concluir um game e entregá-lo da melhor maneira possível (na maioria das vezes, pelo menos).

Recentemente foi lançado o jogo brasileiro Odallus: The Dark Call que tem conquistado público e notas altas em reviews da imprensa (confira nosso review AQUI). Nós fizemos até um vídeo com Danilo Dias, desenvolvedor da JoyMasher, a empresa responsável pelo game, pra conversar um pouco sobre a produção do jogo enquanto nós (cof, cof) jogamos.

Recentemente entrevistamos outra pessoa muito importante: Tiago Santos, responsável pela trilha sonora do jogo. Nós tivemos uma conversa em que descobrimos que a mãe dele teve uma ótima política anti-drogas em casa, além de descobrir como ele está fazendo dinheiro produzindo música pra “joguinhos”.
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Você mora onde e tem quantos anos?

Eu moro em Palhoça, Santa Catarina próximo de Florianópolis. É aqui da região que chamam de Grande Florianópolis. Tenho 30.

Antes de falarmos sobre o Odallus me conta um pouco sobre você e sua experiência com jogos.

Sou de uma família de três filhos homens e tive contato com vídeo game desde muito cedo E como ter vídeo game era um jeito de presentear os 3 filhos de uma vez nós  sempre tivemos um Nes, um Supernitendo, Mega Drive, PS1…

(risos) Sua mãe era bem esperta.

Era sim!  Ela acabou criando 3 filhos nerds e isso acabou deixando a gente longe de más influências. Nosso negócio sempre foi vídeo game, RPG, essas coisas.  Com isso a gente não criava problema na rua pra ela. (risos)

Política anti-drogas.

Sim. (risos)

Como as coisas chegaram em hoje?

Com uns 12/13 anos eu comecei a me interessar por música e aprendi a tocar guitarra. Toquei em algumas bandas e com isso peguei o hábito de compor. Eu nunca tinha pensado em compor pra jogos até que meu irmão mais velho me falou que tinha um amigo fazendo um jogo e perguntou se eu não queria fazer uma música pro jogo dele. Esse amigo do meu irmão era o Danilo e o tal jogo era o Oniken. Então eu resolvi tentar fazer algo e acabei fazendo a música que ficou na segunda fase do jogo.

Você me disse que tocava em bandas. Você já produzia?

Eu comecei a produzir na época das bandas sim, mas não era nada muito profissional. Eu comecei a aprender a produzir porque achava uma maneira organizada de compor e salvar idéias.

Qual era o seu equipamento na época?

Uma interface de áudio e um monte de instrumentos virtuais basicamente.

 

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Depois do Oniken, como as coisas continuaram caminhando?

Depois dessa primeira música o Danilo me chamou mais tarde pra fazer a música final do jogo que acabamos usando também pro trailer. Também fiz a trilha de um jogo de uma empresa aqui de Florianópolis, que não foi lançado ainda e comecei a tentar pegar mais trabalhos na área. É algo que curto muito fazer.

Outro trabalho que fiz foi pra um jogo de uma empresa da finlância também, a Creeng. Foi para o jogo Hockey Legends que é tipo um Elifoot de hockey. Nesse jogo eu fiz a música tema e também trabalhei nos efeitos sonoros do jogo.

Seu equipamento e software mudaram com o tempo?

De hardware pouca coisa mudou. Eu uso um controlador MIDI de 25 teclas e tenho uma placa de áudio de 2 canais. Software eu sempre vou buscando novos e testando bastante.

Voltando um pouco. O Danilo te convidou pra fazer a trilha sonora do Odallus. Foi complicado?

Fácil eu não posso dizer que foi, mas também não foi algo difícil. As referências que o Danilo pedia no jogo eram coisas muito naturais pra mim. Ele é um cara muito tranquilo de lidar e a gente tem quase a mesma idade, da mesma época praticamente.

Então pra mim era tranquilo entender o que ele queria. Foi muito mais intuitivo do que influência direta, entende? A gente conversava bastante sobre o clima do jogo, a história e ai foi tranquilo ir se encaixando.

Porque realmente ficou incrível! Eu lembrei muito de músicas de jogos do meu antigo mega drive.

Obrigado!

E como foi conseguir os sons bit-like?

Cara, com certeza tem muito de mega drive ali, foi o vídeo game que mais joguei na vida (risos)

Eu encontrei um site que disponibiliza de graça os soundfonts dos chips de vídeo games antigos. Os sons dos chips desses consoles. Apesar de a produção ter ficada parecida com músicas de mega drive, no Odallus eu usei em todas as músicas os sons do chip do NES.

E como foi a direção das músicas?

A gente conversava sobre o ambiente, o clima que ele queria passar…

Ele me mandava algumas referências de alguns jogos que ele gostava e alguma screenshot da fase. A música da primeira fase, Town of Glenfinnan, ele me falou que seria o personagem principal chegando em sua cidade, que havia sido recém atacada que estaria parcialmente destruída. Então fiz uma música bem upbeat, que passasse esse clima de ansiedade e pressa.

A primeira música tenta passar esse clima de aventura, pressa e ação. Com o passar das fases vai se criando um clima maior de mistério e suspense, porque o protagonista começa a entender o que está acontecendo. Ai as músicas baixam um pouco o tempo, por que começa a ser muito mais um jogo de exploração.

 

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Além disso, tem algo que foi interessante na produção da trilha pra você?

O mais interessante pra mim foi o aprendizado. Teve muita coisa que eu queria usar nas músicas do Odallus, mas eu não sabia muito como fazer na parte da composição. Acabei estudando e aprendendo muita coisa que pra mim foi nova.

Na parte da produção a mesma coisa. No começo pra mim foi muito difícil conseguir fazer uma música soar bem em 8bits. Eu fui na prática descobrindo muitas coisas e aprendendo muito com o processo.

Teve alguma música exclusivamente complicada ou que você demorou mais tempo nela?

A música que eu mais demorei tempo produzindo foi a Dark Forest. Foi a primeira música que compus pro jogo e nela eu quis encontrar uma fórmula de instrumentos e produção que eu pudesse confiar pro restante das músicas. Então eu passei muito tempo nela, ajustando até encontrar algo que eu gostasse bastante.

Uma música que complicada de compor foi a Aqueducts Area 1. Ela musicalmente foi bem  complicada. A música foi uma parceria com um amigo que trouxe o tema principal, mas de algum modo ele não encaixa e não funcionava pra 8bits. Então gastei bastante tempo pra acertar. Deu bastante trabalho até chegar onde eu queria.

Você começou de maneira meio improvisada. O que você pensa daqui pra frente?

Enquanto eu fazia a trilha do Odallus trouxe um amigo que curte bastante empreendedorismo que também é músico e a gente tá tentando profissionalizar isso. Divulgar mais nosso trabalho e melhorar a qualidade pra ir tentando cada vez mais se consolidar no mercado. Pra isso fundamos a Serenati.

Você já pode falar sobre a Serenati pra nós?

Claro! Serenati é formada por mim e meu amigo João Selarim e o nosso foco é audio para games. A gente está passando por um processo agora de ajustes no site e na page do facebook. Mas a ideia é dedicar mais tempo pra isso.

Legal. Uma pergunta que quem trabalhar com isso se faz. Como se ganha com produção musical pra jogos aqui no Brasil?

Eu calculo o número de horas que vou gastar com o projeto/música e calculo quanto eu acho justo ganhar por hora desse trabalho.

Um exemplo: Eu cobro por hora uns 80 reais. Pra fazer uma música de 2 minutos, por exemplo eu preciso de 4 horas pra deixar ela pronta. Dessa forma são 320 reais por 4 horas de trabalho já finalizado. É um exemplo, mas depende muito do nível de complexidade da música, tamanho, tipo de composição…

Pra finalizar. Trabalhar com jogos é o sonho de uma geração inteira de garotos e garotas. Você gostaria de dizer alguma coisa pras pessoas que querem trabalhar com isso?

Cara, o que eu tenho a dizer é pro pessoal estudar seja qual área de games atrai mais a pessoa. O que se precisa é ter competência. Hoje em dia existe muita informação por ai, de fácil acesso. Se especializar no que você gosta e correr atrás, trabalhar, trabalhar e trabalhar.

Minha esposa costuma brigar comigo porque quando eu vou trabalhar com música aqui casa, eu passo uma hora indo e voltando nos mesmos 10 segundos de música. Mas é isso, eu procuro fazer da melhor maneira e isso leva tempo e trabalho. Mas como tu falou, é o sonho de muita gente trabalhar com jogos como é o meu também. Tem que se estar preparado pra trabalhar muito pra alcançar os resultados que você curte e assim atingir os objetivos e acho que isso serve pra tudo: arte, game design, desenvolvimento e roteiro.

Foi ótimo falar com você, Tiago.

Eu que agradeço.

 

Escute a Playlist com toda a trilha sonora do Odallus no bandcamp (e dá pra comprar também).