Joe Bennet trabalha atualmente na série do Deathstroke para a DC Comics, mas na última CCXP o artista paraense apresentou algo que me empolgou bem mais: a volta do Esquadrão Amazônia, grupo de super-heróis brasileiros que ele criou no começo dos anos 2000.

A original e o reboot

O Esquadrão Amazônia original teve apenas uma edição e foi feita para vender os serviços da finada Amazônia Celular. Mas a ideia de um time de super-heróis nacional com poderes inspirados pela fauna amazônica ficou na cabeça de Bené, como Joe é conhecido aqui por essas bandas. Por falta de editora interessada o projeto acabou arquivado por vários anos, mas saiu da gaveta no ano passado graças ao sistema de Crowdfunding:

“Com crowdfunding, você editar sua própria revista é muito mais rápido e prático. E no Norte havia essa defasagem de artista e editora, que não havia. Com o Catarse isso se tornou mais palpável, real.” – explica Joe. Com uma meta de R$ 16.000 reais o projeto foi bem-sucedido, arrecadando R$ 23,133. Me orgulho em dizer que fui um dos apoiadores.

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O Reboot

Se na HQ original de 20 páginas os heróis são apresentados de forma apressada, na nova versão os criadores (a obra teve roteiro do Alan Yango) puderam mostrar uma breve história de origem de cada um deles. Alguns heróis tiveram ainda os nomes alterados.

AÇÚ: Um índio que participou de um rito de passagem à idade adulta, bebendo a água de um lago onde havia uma misteriosa pedra das estrelas. De todos os meninos que passaram pelo ritual, apenas ele ganhou super força e vôo, sendo considerado o guerreiro escolhido de Tupã.

JUREMA (Cunhã-Poranga, no original): Irmã de Açú, desobedeceu as regras da aldeia e bebeu da água, ganhando os mesmos poderes que o irmão. Tem como melhor amiga desde a infância uma jornalista da cidade, tem muito mais senso de humor que o irmão e fala com gírias.

ONÇA: Roberta (Júlia, no original) era uma criança frágil e doente mas cresceu e se tornou uma das maiores geneticistas do mundo. Para fortalecer sua condição física ela criou um soro com hormônios de origem animal alterados geneticamente. Acabou ganhando aparência e habilidades felinas. É o cérebro da equipe.

BÚFALO (Boi, no original): O que era antes um brutamontes caladão estilo Coisa, aqui ganhou uma profundidade bastante interessante. Criado por pais evangélicos, Josué passou a vida escondendo a aparência e temendo ser um monstro “ou demônio, como o pastor disse”. Após contato com a Dra. Roberta ele finalmente é convencido pelos pais de que na verdade recebeu um dom de Deus, e agora tem como missão divina combater o mal.

IARA: Adolescente com capacidade de criar ondas sônicas destruidoras com a voz. Foi descoberta por Roberta e se tornou sua pupila.

ARUÃ e SUCURI (Jibóia Branca, no original): Um casal de geólogos que entrou em contato com um minério desconhecido que acabou se misturando à composição do corpo deles, dando aos dois as habilidades mais estranhas. Uma mistura de T-1000 e Visão.

A Ameaça veio do Espaço

Se no original o grupo enfrenta monstros derivados da poluição e homens ricos devastando a floresta, agora a história gira em torno de alienígenas: uma gigantesca nave invadiu nosso planeta e parou bem em cima da Baía do Guajará, em Belém-PA. Logo fica claro que eles não são pacíficos e o herói local, O Poderoso Maximus (uma mistura de Superman e Shazam, criado por Alan Yango e publicado de forma independente há alguns anos) dá combate às gigantescas criaturas que descem da nave, mas não é páreo para elas. É hora do Esquadrão Amazônia se revelar ao público e comprar a briga.

Não darei mais spoilers do que já dei, mas já adianto logo que o fim não é exatamente o fim (algo que estamos acostumados a ver nos quadrinhos). Minha primeira surpresa com a revista foi encontrar na capa a informação “1 de 2“, algo que não havia sido informado no projeto do Catarse. Então quem esperava uma graphic novel, com um arco fechadinho, pode se decepcionar. A revista tem o ritmo e o sensação de uma publicação serializada, periódica. Nesse sentido não deixa nada a dever para séries da Marvel ou DC e eu acompanharia felizão.

O próximo capítulo deve contar o desfecho do encontro com os alienígenas que, aliás, parecem ter papel importante na vida do Esquadrão: além da pedra espacial e do misterioso minério que deram poderes aos heróis, Dra. Roberta ainda menciona em determinado momento uma perda que tiveram na ‘Missão Colares‘. Pra quem não ligou uma coisa na outra, Colares foi a cidade paraense que ficou famosa na década de 70 por ter sido cenário da Operação Prato, a investigação ufológica mais bem documentada do mundo. Me deixou ansioso pela edição 2.

Regional até o Tucupi

Quem leu as declarações que o Joe Bennet fez sobre regionalismo nos quadrinhos percebeu o quanto ele é apaixonado pela Amazônia. E isso fica evidente na HQ: cenários como o Mercado Ver-o-Peso, gírias e até mesmo gente usando camisas do Paysandu, Remo e Tuna Luso (times de futebol do Pará) a gente encontra na HQ. Além de ambientarem a história, ver essas coisas representadas no traço foda do Joe (e também de Alan Patrick) em um quadrinho de super-heróis dá orgulho.

Fui buscar minha HQ pessoalmente com o Joe Bennet na CCXP

Mas será que o Esquadrão vai passar também em Manaus?

Com certeza. O Esquadrão Amazônia vai abarcar não só toda a Amazônia Legal como o mundo inteiro. Mas, como te falei, o nosso umbigo é Amazônia, nós temos que olhar para a nossa região“, me respondeu Joe.

Enquanto não sai a edição 2 (a previsão é pra daqui a 3 meses), ao menos uma coisa de Manaus dá pra encontrar na edição 1: eu.

Sim, olha eu ali, na página 34,  impressionado com a luta entre o Poderoso Máximus e os gigantes. Pois é, o cara que já desenhou o Supremo para o Alan Moore agora me colocou numa HQ. Te mete.

Pouca coisa incomoda

A HQ tem 40 páginas e, mesmo sendo o dobro da original, ainda achei pouco, principalmente porque estava apresentando 7 heróis. A história fica muito condensada, cheia de explicações do narrador. Achei ainda que o papel utilizado, um cartonado fosco, diferente do que leitores de quadrinho estão acostumados, fez a impressão ficar (literalmente) sem brilho, meio morta.

Mas o que realmente incomodou foram as diversas vezes em que os heróis estão no meio de uma luta e ainda assim surgem balões de pensamento em que eles nos explicam desde seus sentimentos “Estive muito reticente em tomar uma atitude com relação a tudo bla bla…” a coisas óbvias e desnecessárias como “Estou preso. Preciso me libertar”, que lembram muito mais os quadrinhos clássicos que os modernos.

O design de uniforme do Açú e da Jurema, ainda que muito bonitos –  uma mistura de indígena brasileiro e acessórios maias/incas –  não parecem fazer muito sentido. São só estéticos mas sem função. Açú usa um cocar metálico que mais parece uma antena e a Jurema, coitada, nem posso imaginar o desconforto que deve ser lutar usando uma calcinha de aço.

Ainda assim, a leitura VALE MUITO a pena. A arte, volto a dizer, é impecável, a história é interessante e a HQ executa muito bem a proposta de apresentar um grupo de super-heróis brasileiros sem causar vergonha alheia. Empolgação e diversão certa.