Há nomes na indústria do entretenimento que geram expectativa onde quer que estejam envolvidos. Robert Kirkman se tornou um desses nomes após o sucesso estrondoso do quadrinho The Walking Dead, que foi adaptado para uma série de TV e lhe rendeu uma boa reputação e uma posição de destaque dentro da Image Comics, uma das principais editoras de quadrinhos dos EUA. Hoje resolvi falar do novo trabalho de Kirkman, Oblivion Song.

Neste primeiro volume, lançado pela editora Intrínseca, conhecemos Nathan Cole, que tem a ingrata missão de visitar o mundo de Oblivion, uma dimensão paralela à nossa que surgiu após um acidente inexplicado. A “Transferência“, como ficou conhecido o acidente, efetuou uma troca inusitada: uma extensa área da cidade da Filadélfia foi parar em Oblivion e uma área de tamanho equivalente ficou no lugar. A “Transferência” levou mais de 300 mil habitantes da cidade para a outra dimensão e trouxe de lá inúmeras criaturas selvagens, o que resultou numa sangrenta tragédia.

Após o ocorrido, Nathan desenvolve uma tecnologia que pode transportar pessoas para Oblivion e o governo monta uma equipe de resgate para salvar sobreviventes. Depois de alguns anos, sobreviventes raramente são encontrados e o programa de resgate é desativado. Nathan, porém, continua indo até Oblivion em busca de outras pessoas e conta com a ajuda de uma pequena equipe.

Um dos aspectos mais interessantes de Oblivion Song é a capacidade de Kirkman de criar personagens com profundidade em poucas páginas. O quadrinho faz alusões constantes a casos de terrorismo ou acidentes reais que causaram grandes tragédias, com histórias de personagens que se sacrificaram para salvar outras pessoas e até mesmo um memorial para as vítimas. O stress pós-traumático também é bem explorado e cria mais uma camada bem importante para o desenvolvimento da história.

Mas neste primeiro volume outro aspecto pode ser colocado como o tema principal: a culpa. E aqui, para os mais perspicazes, pode haver um grande spoiler, então, estejam avisados. Nathan continua, mesmo sem recursos e sem apoio do Estado, dia após dia, visitando Oblivion e se arriscando para salvar o máximo de vidas que conseguir. Sua obsessão coloca em risco suas relações e sua própria vida, mas por que? Logo, Kirkman nos apresenta um possível motivo: Ed, irmão de Nathan que foi parar em Oblivion com a “Transferência”. Apesar de Ed ser considerado morto, como todas as outras vítimas desaparecidas, Nathan não desiste do irmão e continua se arriscando. Mas a obstinação do protagonista tem uma motivação maior e eu juro que não esperava por isso quando o momento chegou.

Além do bom desenvolvimento de personagens, Oblivion Song parece ter nascido para se tornar um produto de outra mídia (já há informações sobre a produção de um filme pela Universal). Kirkman sabe muito bem trabalhar o ritmo da narrativa. Em alguns momentos ele parece acelerar a história ou dar pouca importância para eventos que poderiam se alongar na mão de outros autores, mas no final tudo se desenrola bem e percebemos que a teia de um enredo maior se precipita por trás dos acontecimentos mostrados.

A arte do desenhista Lorenzo De Felici combina muito bem com a história, principalmente por conta do design dos monstros e da caracterização do mundo de Oblivion, e também pelas expressões e movimentação dos personagens, algo muito importante para a atmosfera de horror que Kirkman evoca durante o encontro com as criaturas. As cores da artista Annalisa Leoni também são dignas de elogios. A paleta de cores marca a mudança constante de um mundo para o outro, com tons mais pastéis em Oblivion criando uma atmosfera selvagem e estranha.

Apesar de Kirkman desenvolver bem seus personagens secundários como já foi dito, minha única crítica é para alguns momentos onde questões que seriam muito complicadas se resolvem facilmente. Os personagens superam diferenças e decidem colaborar sem hesitar muito, mas apenas quando é necessário para a trama continuar. Mesmo assim, tudo funciona bem e a narrativa prossegue, sem furos ou maiores problemas.

Com Oblivion Song, Kirkman abre uma nova saga com grandes possibilidades de desenvolvimento e que tem tudo para virar uma excelente franquia de filmes. Se manter seu ritmo e qualidade, essa será mais uma contribuição de Kirkman de grande importância para o mercado de quadrinhos e outra etapa no caminho do autor para se tornar um dos maiores nomes da nona arte produzida para o mainstream.

Classificação:

Avaliação: 3.5 de 5.

SINOPSE: Anos atrás, 300 mil habitantes da Filadélfia foram transportados para Oblivion, uma nova dimensão aterrorizante que surgiu de forma inexplicável e destruiu áreas da cidade. Os desaparecidos tentam sobreviver enfrentando seres monstruosos em um ambiente inóspito e atordoante, marcado por raros momentos de calmaria. O governo investiu muitos recursos em incursões para resgatar as vítimas, mas depois de dez anos as buscas foram encerradas. No entanto, se depender do cientista Nathan Cole, ninguém vai ficar para trás. Nathan desenvolveu uma tecnologia extremamente instável que lhe permite visitar Oblivion todos os dias.

AUTOR: Robert KIRKMAN é um escritor de história em quadrinhos americano, conhecido por seus trabalhos para os quadrinhos The Walking Dead e Invencível, ambos para a Skybound e a Image Comics, da qual é um dos cinco sócios, sendo o único entre eles que não é co-fundador da empresa.
ILUSTRADOR: Lorenzo De FELICI
CORES: Annalisa LEONI TRADUÇAO: Fernando SCHEIBE
EDITORA: Intrínseca
PUBLICAÇAO: 2019
PÁGINAS: 144