Olá, leitores! Todos bem? Ok, eu sei que não está TUDO bem, não em plena pandemia. Mas não é curioso que, durante uma crise de saúde pública de proporções globais, tanta coisa esteja acontecendo no cenário de quadrinhos? 

Já falamos por aqui sobre como a indústria dos quadrinhos pode ser afetada pela pandemia de Covid-19. A questão é que, apesar de muitos eventos terem se adaptado devido às recomendações de distanciamento social, o cenário não parece tão parado quanto se esperaria para um “ano perdido”, como alguns têm nomeado este fatídico 2020.

Todas as feiras, do mercado brasileiro ou estrangeiro, tiveram (ou terão, como a CCXP Worlds) suas versões on-line, inclusive com boas surpresas. É o caso da DC Fandome que trouxe conteúdo de qualidade gratuito para os fãs e ajudou a levantar um pouco da autoestima DCnauta, apesar do foco do evento não ter sido as histórias em quadrinhos num primeiro momento.

O movimento das editoras também continua e dá sinais de que o mercado brasileiro está forjando com as próprias mãos um caminho para fora da crise (ou crises). Já comentei sobre o recomeço da Guará, com lançamento de material nacional mensal e digital e também sobre a aposta da nova gestão da Conrad nesse mesmo quinhão de mercado. As editoras de pequeno e médio porte como Skript, Graphite, Figura etc., têm investido em nichos específicos, contato constante com o público e financiamento coletivo e isso, aparentemente, já mostra bons resultados. O fenômeno Pipoca e Nanquim também merece destaque com um modelo de negócio enxuto, edições definitivas e conteúdo transmídia que complementa o catálogo da editora.

Outra mudança, esta bem mais profunda e que não é nova, é a decadência do mercado de super-heróis americano. Não é de hoje que se discute o modelo de vendas e de publicação dos comics: pontos de vendas cada vez em menor número, quantidade excessiva de títulos e histórias que exigem do leitor um background extenso. Os efeitos, como a deficiência crônica em renovação de público, são nocivos para toda a indústria.

A diferença é que mais gente está falando abertamente sobre isso e com maior frequência. Nomes fortes da indústria como Gerry Conway, criador do Justiceiro, concordam que o mercado norte-americano chegou num ponto insustentável. Já durante a pandemia, a DC deixou de utilizar os serviços da maior distribuidora que eles têm por lá, a Diamond, sem falar nas comic shops que fecharam as portas por conta do vírus (estimava-se que eram até 2500 nos EUA e Canadá, antes da crise) e dos números de venda que enfrentam queda. Críticos e outros profissionais do mercado brasileiro como Érico Assis e Roberto Sadovski, também já se pronunciaram sobre o assunto e, no plano geral, parece haver um consenso: o mercado de quadrinhos de super-heróis precisa mudar profundamente e já.

A representatividade e questões sobre machismo, homofobia, direitos humanos etc. também não deixaram o holofote, impulsionadas por acontecimentos sociais de grande impacto como o movimento Black Lives Matter e pelo envolvimento de celebridades do cinema ou da indústria de quadrinhos que se expressam politicamente. Essas discussões estão mais presentes do que nunca e os reflexos na indústria são amplos e estruturais.

E todas essas mudanças acontecendo ao mesmo tempo em que precisamos pensar (e agir) sobre um vírus recente e todas as suas consequências para as nossas vidas. Precisamos de mudanças, sim.

Se queriam uma mensagem final sobre calma no meio desse turbilhão, desculpem, minha dica é outra. Como eu disse, precisamos de mudanças, e elas não acontecerão sem discussões, sem incômodo e sem barulho. Também não será fácil se você, que consome quadrinhos, não se envolver. Então, discuta, comente, compre, divulgue, mas preserve a sua saúde e a dos outros, claro.

Até a próxima!