O livro ‘Os Guardiões da Humanidade’, lançado pela editora Novo Século no selo Novos Talentos, retrata a Manaus do ano 2125, onde a tecnologia moderna se mistura à magia e às lendas, em uma sociedade distópica governada por grandes corporações e sociedades secretas.
A cidade agora é dividida em duas: a Cidade Alta, com tecnologia de ponta e protegida por uma cúpula que controla o clima (ar-condicionado central, que sonho!) e a protege de todo tipo de intempéries, e a Cidade Baixa, a parte fodida mal cuidada, antiga e alagada (também conhecida como o Centro de Manaus em 2015).
É nessa parte da cidade que vive Peter Hawkson, “um garoto órfão e sem muitos amigos, que se amarra em skyphismo e futebol mecatrônico, apesar de sua clara inaptidão para estas práticas. Mora num dos prédios abandonados da Baixa-Manaus, de onde viaja todo dia até a grande cúpula na alta-cidade, para estudar, esperando se tornar futuramente, pelo menos, um operador mecatrônico de construção, já que as oportunidades desta nova Ordem Mundial são ínfimas”, como conta o site da editora.
Acontece que ele é descendente de um dos mais antigos e poderosos Guardiões da Humanidade e, quando se envolve em um acidente, uma guerreira salva sua vida e faz com que ele desperte poderosas habilidades, que serão necessárias na luta contra um mal ancestral que está prestes a despertar.
Escrito por dois jogadores de RPG, Janderson Lopes e André Oliveira (que infelizmente faleceu no ano passado), o livro se baseia em uma aventura jogada pelos dois. Por ser um livro de Fantasia, em Manaus e com origem no RPG, não tinha como o livro não despertar meu interesse. Por isso, resolvi bater um papo com o Janderson (da foto abaixo) pra saber mais. Confira a entrevista:
Sei que a inspiração veio do RPG. Explica melhor essa história.
Bem, comecei a escrever em meados de julho do ano de 2007, ainda em Minas Gerais, quando estava realizando o curso de Oficial Bombeiro Militar. Ao retornar para cá (Manaus) em dezembro de 2007, tinha praticamente terminado o que deveria ser minha primeira obra “A Ordem dos Céus – O Alvorecer de Uma Nova Lenda”. Ao chegar, encontrei um amigo chamado Kainã Negreiros. Ele se interessou em ler meus escritos e fez uma observação importantíssima: “Cara, gostei demais da sua história, mas como é o teu mundo?”. Bem, eu não entendi nada do que ele queria saber. Como assim “Como é o teu mundo”? Aos meus olhos, ele estava bem ali, descrito na história. Mas não estava e eu ainda não enxergava isso. Eu sabia escrever uma história de personagem, pois era o que via na TV e nos livros, mas não sabia criar um mundo nem fazia ideia da importância disso. Foi então que ele me apresentou ao André L. S. Oliveira, meu saudoso amigo, mestre de RPG, e co-autor do livro. O André era mestre de RPG e sabia melhor do que ninguém como criar um mundo ficcional. Então, passei três anos jogando com o André e mais uns valorosos companheiros e aprendi na pele como ser um herói de um mundo ficcional. Definitivamente, jogar RPG deu um novo rumo à minha forma de escrever e de ver a trama e o mundo ficcional. E por isso eu agradeço aos nobres amigos que comigo jogaram tantas horas e dias, sábados e domingos, dias normais e feriados. Depois de três anos de jogo, eu e o André resolvemos escrever um pouco de nossas histórias e assim criamos o mundo do livro que é justamente uma projeção futurística do mundo onde jogávamos. A campanha de RPG era jogada em 1940 e nosso mundo foi criado em 2125, com personagens que seriam os descendentes dos nossos antigos personagens. Peter Hawkson é um descendente de John Hawkson (ou Johnson, para os mais próximos), um detetive com poderes sobrenaturais, justamente o meu personagem. Existia um elfo, que era interpretado pelo Leandro; um caçador, interpretado pelo João; um engenheiro, interpretado pelo Carlos; um médico, interpretado pelo Rodrigo; arqueólogo, interpretado pelo Fernando e tantos outros personagens que marcaram o passado desta história, que certamente tem influência nesse novo mundo do futuro, e aos poucos vai revelando sua complexidade. Não seria possível sem a plataforma e a visão de mundo que é dada pelo RPG. Sei que muitos dos colegas nerds sabem, mas é sempre bom lembrar que muitas das boas histórias que estão por aí fazendo sucesso vieram direta ou indiretamente dos jogos de RPG, que ajudam a abrir a imaginação de qualquer escritor.
Fora o RPG, que outras obras influenciaram vocês?
Bem, temos O Senhor dos Anéis, Lugar Nenhum (de Neil Galman), Star Wars, Star Trek, Percy Jackson e os Olimpianos, todos do Harry Potter, entre tantos outros. Mas destacadamente, devo dizer, os contos de Call Of Cthulhu, que davam a temática de terror e que muito influenciaram tanto a mim, quanto principalmente ao André, que, por sinal, narrava a aventura de RPG num universo de temática bastante semelhante, com apenas uma diferença: que é de onde varia nosso mundo. Nos contos de Lovercraft, os humanos são sempre impotentes diante do grande e enlouquecedor mal. No nosso mundo, o mal assim também existe, mas sempre que ele se manifesta, ou seja, diante da magia emanada por essas e outras criaturas, humanos podem vir a despertar um poder desconhecido, que os tornam capazes de agir como “Guardiões da Humanidade”.
Acho muito legal a editora Novo Século apostar em um livro ambientado em Manaus, já que o “normal” são histórias em São Paulo e Rio de Janeiro, que, em teoria, apelam para um público maior. Como foi esse processo de ser aceito pela editora?
Bem, foi bem simples, na verdade. A Novo Século apresenta dois tipos de selo. Um deles é voltado para os novos escritores. Nesse novo selo, o risco é compartilhado entre ambos. O novo escritor repassa seu original para ser avaliado e se a editora acha que tem algum tipo de potencial, lança nesse selo, fazendo uma impressão mínima, que é de cerca de 1500 livros. É necessário que o novo autor adquira uma parte dessa tiragem, a qual ele utiliza para fazer sua própria divulgação no âmbito regional, enquanto que a editora faz a divulgação em âmbito nacional. Se ao final de um ano houver uma boa saída, então existe a possibilidade de ser feita uma nova tiragem, baseada num novo contrato. Para o escritor que escreve dentro do estilo da editora e que quer realizar o seu sonho de publicação, como foi o meu caso e do André, valeu a pena.
O seu co-autor, o André Oliveira, era ambientalista, e acredito que isso tenha influenciado a obra, não? Sendo você militar e um evangélico fervoroso, acha que essas duas fortes características influenciaram a obra de alguma forma? Se sim, como?
Com certeza, influenciou totalmente. Sempre digo que se a obra está ambientada em Manaus é justamente por causa do André. Ele amava Manaus. Amava o Amazonas. Amava lutar pelo desenvolvimento com sustentabilidade. Dava aula, participava de ONGs que promoviam isso. Escrevia projetos e punha em prática muitas ações. Quem o conheceu entende bem o que eu estou dizendo aqui. E, no meu caso, também. Tanto o fato de ser militar quanto o fato de ser evangélico acabam refletindo bastante em alguns personagens, que passam a esboçar ora a seriedade e detalhes da experiência militar, ora a fé na capacidade de mudar e de ascender, que existem em cada ser humano.
Com a tragédia que foi o falecimento do André antes mesmo do lançamento da obra, como ficaram os planos para as sequências?
Bem, desde o primeiro momento em que repassamos o original da obra para a Novo Século, ficou faltando apenas a arte gráfica e algumas revisões. Eu tive que fazer os desenhos de cada capítulo, pois acreditávamos que os desenhos iriam tornar nosso livro mais interessante. Nesse processo de revisão e criação da arte gráfica, inclusive da capa, foi quando o André nos deixou. Passei uns meses sem acreditar e outros sem muita disposição para terminar os desenhos e finalizar a revisão, o que demorou ainda mais para que o livro chegasse em mãos. Antes disso, porém, nesse interim, continuamos a nos reunir e a tecer o que seria o próximo volume. O nome “O Despertar do Dragão” foi dado pelo André. Combinamos algumas reviravoltas, que acreditávamos que envolveria ainda mais o público com os personagens, numa tentativa de recriar mais um clímax perturbador ao final deste. Agora que já escrevi algumas páginas (cerca de 100), percebo o quanto será difícil chegar a esse clímax, principalmente sem a pressão e orientação de meu saudoso amigo. Espero sinceramente que Deus me capacite a cumprir essa missão e assim não desapontar os leitores que já se encontram envolvidos com a trama e seus personagens. A verdade é que tínhamos previsto 3 livros, uma trilogia, e isso é um desafio, um grande desafio. E os leitores entenderão isso ao folhearem o segundo volume, onde novos personagens devem surgir para manter a lógica dos eventos e engrandecer ainda mais a trama. E não só novos personagens, como também novos inimigos, aliados, raças e lendas. É nesse segundo volume que planejamos o surgimento de alguns elementos da cultura amazonense, não exatamente como são conhecidos, mas sim da forma em que esse universo ficcional exige. No universo dos Guardiões da Humanidade, onde seres humanos despertam suas potencialidades e ascendem a três possíveis categorias (Alfas, Arcanos e Singulares), todas as lendas de nosso mundo coexistem dentro de uma sombria realidade, mortal ou não aos seres humanos.
O site da obra menciona uma aventura paralela “No Ritmo do Coração” e também uma HQ. Como estão esses projetos?
Muito atrasados. Estou pensando em lançar o “No Ritmo do Coração” depois de fechar a trilogia para não afligir os leitores, que já começam a me pressionar pelo segundo volume. Nas páginas que já escrevi, o personagem principal dessa aventura paralela já começa de onde teria terminado. Como não vou tecer muitos detalhes de seu passado, espero que ao longo do livro 2 os leitores queiram saber um pouco mais de sua história. Se isso não acontecer, simplesmente não gastarei tempo com a realização da história. A verdade é que estou atolado de ideias, mas sem tempo algum, graças a minha profissão (sou bombeiro militar e assessor de comunicação institucional). Sobre a HQ, ainda procuro parcerias. Conheço muita gente boa de desenho, com traços fantásticos, mas todos andam muito ocupados, principalmente agora com essa crise toda. Meu sonho é não só fazer essa HQ, como também fazer a animação do primeiro livro. Estou correndo atrás de saber como funciona e de estabelecer parcerias para tal. Quem sabe uma coprodução entre o Brasil e um outro país, como o Japão, que já tem conhecimento e tecnologia (sou fã de animes rsrs).
Nunca surgiu a ideia de lançar também um sistema de RPG ambientado no universo do livro?
Sim, surgiu, e eu até já comecei a desenvolver, mas esbarrou nesse momento justamente na produção da arte gráfica e no teste do sistema. Essa ideia de criar um jogo baseado em um sistema novo já era do André e antes dele partir já estávamos jogando algo baseado nessas regras. O André havia criado um sistema bem simples que ele denominava de Pré-Aurora, que se baseava em rolar 5 d10 para tudo. Um jogador era capaz de criar sua ficha em poucos minutos e já começar a jogar. Ele tinha tudo isso na cabeça e fazia naturalmente. No meu caso, não é tão simples. Não tenho suas habilidades de narrador e estou apanhando para criar as regras, apesar de já ter definidos as bases. Será um sistema variante do Pré-Aurora criado pelo André, mas que guardará algumas regras de ouro que tornavam o Pré-Aurora tão legal de jogar. Mas não contem com isso para agora.
E o contato com os leitores, como é? Alguém já chegou em você pra tirar dúvidas sobre a história ou tentar descobrir algum segredo do próximo livro?
Bem, eu sou bem aberto e me amarro em ouvir as opiniões e dúvidas dos leitores. Acho que com isso fico ainda mais motivado. É ótimo quando alguém te diz que ficou chocado com aquela parte empolgante ou que torce muito por um personagem ou outro. Gosto principalmente quando tentam interpretar algo que ficou omitido ou mal explicado, pois minha mente fervilha de novas possibilidades. Normalmente acabo conversando com esses leitores no facebook ou através da fanpage. É sempre uma ótima experiência.
E fora de Manaus? Tem alguma ideia da aceitação do livro em outros lugares?
Bem, realmente não sei. Sei que vendi para pessoas de São Paulo, Espirito Santo e Minas Gerais, que queriam o exemplar autografado. Eles me passaram a impressão de que gostaram bastante. Espero que tenham sido sinceros. Ainda aguardo o retorno da editora sobre a venda dos exemplares para ter uma ideia melhor das vendas.
Como os leitores do Mapingua Nerd podem adquirir “Os Guardiões da Humanidade”?
O livro já esteve a disposição na Saraiva do Manauara shopping e na Bemol, mas acredito que já tenha esgotado. Os leitores que quiserem podem adquirir comigo mandando um whatsapp para o telefone (92) 98122-3957 ou entrando em contato na fanpage no Facebook. Tem ainda o site: www.osguardioesdahuumanidade.com.