Por Margareth Artur / Portal de Revistas USP
A cidade de Belém do Pará é conhecida pelas tradições culturais, pela culinária exótica, pelas belezas naturais. A Amazônia, por sua vez, é a maior floresta tropical do mundo, e isso todos já sabem, mas é provável que poucas pessoas conheçam a arte das histórias em quadrinhos e seus artistas premiados, ambos nascidos e criados em Belém, região ribeirinha da Amazônia. O artigo da historiadora Juliana Angelim traz um panorama deste cenário na Amazônia, apresentando autores, grupos e suas criações. Mas também suas formas de viabilização financeira – concursos, editais e patrocínios privados, entre outras -, além dos eventos locais e os espaços de circulação das histórias. Apresentado na quarta edição das Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos, o trabalho foi vencedor do Prêmio Álvaro de Moya de Incentivo à Pesquisa em Quadrinhos de 2018.
Ao se reportar aos quadrinhos paraenses, a autora comprova a existência de uma produção de histórias em quadrinhos nacionais e regionais bastante expressiva, coexistindo com a importação de obras de outros países. No Pará, a publicação de HQ surgiu em jornais, concursos e editais. O estímulo para a criação individual foi visado com o chamado “fanzine”, o quadrinho alternativo, a “publicação independente”. Assim apareceram os grupos e suas produções, destacando-se o grupo Ponto de Fuga, com fanzine de mesmo nome; e o Catarse Quadrinhos (Prêmio IAP de Edições Culturais do ano de 2008). Algumas revistas independentes, tais como Belém imaginária, Encantarias – a lenda da noite e Pretérito mais que perfeito também “adquiriram repercussão inclusive em outros estados”.
Bichara Gaby foi o criador da primeira história em quadrinhos amazônica em 1972, publicada pelo jornal Folha do Norte, “na verdade, uma entrevista em quadrinhos, realizada com o grupo de teatro ‘GRUPAÇÃO’ “. Nos anos de 1988 e 1989, coube ao governo, por meio da Secretaria da Cultura e da Fundação Cultural do Pará Tancredo Neves, incentivar a produção local de quadrinhos, com o lançamento do chamado Edital de Arte, cujo resultado foi a publicação de seis álbuns de quadrinhos, tais como o Vero-Pexe e sua turma, de Luiz Paulo Jacob e Gabriel de Jesus. Branco Medeiros foi o pioneiro em elaborar histórias em quadrinhos no computador, a partir de 1990. Não se pode deixar de citar Crash, de Gian Danton e Bené Nascimento. Este último, autor de produção premiada, é “mundialmente conhecido como ‘Joe Bennett’, desenhista contratado pela editora Marvel”, explica a autora.
O grupo Ponto de Fuga incentivou a criação de gibitecas e foi responsável pela realização de eventos como o Amazônia Comicon, o último ocorrido em 2018, ainda a ser editado e publicado. Vale citar o fanzine de estilo underground A Boca no Mundo, o Catarse Quadrinhos (uma publicação contemplada pelo Prêmio IAP de Edições Culturais 2008) e o trabalho de Volney Nazareno e os outros integrantes do Estúdio Casa Velha para a publicação das novelas gráficas Belém Imaginária e Encantarias, esta última patrocinada pelo Banco da Amazônia.
Embora a produção de revistas em quadrinhos periódicas em Belém careça de circunstâncias favoráveis à sua manutenção, atualmente surgem alternativas que beneficiam os quadrinhos de edição única – como as campanhas de financiamento coletivo lançadas na plataforma Catarse –, além da possibilidade de publicação no meio digital, por meio de blogs e redes sociais.
Dois projetos de quadrinhos locais foram muito bem-sucedidos: Castanha do Pará – prêmio Jabuti 2017 -, de Gidalti Moura Júnior; e Esquadrão Amazônia, de Alan Yango e Bené Nascimento. A pesquisadora cita Waldomiro Vergueiro, professor da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP e especialista em quadrinhos, o qual atesta que “o panorama dos quadrinhos no Brasil abrange um mercado composto de uma ampla e pujante rede de fanzines e revistas alternativas, publicadas de forma artesanal ou com suporte de recursos eletrônicos, principalmente a internet”.
A autora convida o leitor para olhar atentamente e comprovar a riqueza da chamada Nona Arte em Belém e na Amazônia, pois o desenvolvimento do mercado de quadrinhos na capital paraense é bastante expressivo, com apoio ou não do governo, graças ao talento dos quadrinistas e suas histórias criativas e inusitadas, cada vez mais reconhecidas em âmbito nacional.
Artigo
ANGELIM, J. A Nona Arte na Amazônia. 9ª Arte, São Paulo, v. 7, n. 1-2, p. 73-83, 2018. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/nonaarte/article/view/157289 . Acesso em: 16 ago. 2019.
Contato
Juliana Angelim – Mestranda do Programa de Pós-Graduação em História Social da Amazônia da Universidade Federal do Pará (UFPA).