Um piloto americano sobrevivente da Segunda Guerra Mundial abandona sua pátria desiludido com a violência e as imposições da sociedade ocidental, se muda para Manaus, compra um velho avião monomotor e passa a ganhar a vida como guia turístico. Por mais curioso que possa parecer, esse é o background de Jerome ‘Jerry’ Drake, protagonista do quadrinho italiano Mister No.


Criado em 1975 por Sergio Bonelli (utilizando o pseudônimo de Guido Nolitta) e Gallieno Ferri, “Mister No” teve 379 edições publicadas. Sergio Bonelli foi diretor e dono da editora italiana que leva seu nome, criador de Zagor e editor da aclamada hq Tex.

Nas edições #6 e #7, nas primeiras histórias que se passam no Amazonas, a aventura de Jerry Drake permeia uma lenda indígena muito antiga.

Há um templo maia escondido no coração da floresta amazônica e desde a extinção do antigo povo que lá habitou ninguém mais o adentrou. Dizem entre os índios Tukanos – os mais próximos em termos de localização geográfica – que lá habitam os cadáveres dos antigos senhores da floresta. E uma remota lenda afirma que, se qualquer estrangeiro ultrapassar a sua entrada, toda a casa de pedra será destruida e os espíritos dos mortos se vingarão perseguindo aqueles que não os souberam proteger dos profanadores, ou seja, os Tukanos.

Erros geográficos

Em Mister No – No templo dos Maias, Guido Nolitta traz a lendária civilização que habitou grande parte do México e o norte da América Central (onde hoje se localiza Guatemala, El Salvador e Honduras) para dentro do Amazonas. O roteirista se baseou em uma inscrição encontrada nas Honduras Britânicas, que dizia que um grupo de exilados políticos maias teria deixado Yucatán, se estabelecendo em uma zona da Amazônia brasileira.

Entretanto, entre os arqueólogos há um consenso de que nunca houve contato entre os indígenas brasileiros e a civilização conhecida pela riqueza do sistema de escrita, dos estudos matemáticos, astronômicos e suas construções. A decadência dos Maias acontece no  século XV ao ser absorvido pela expansão do império Asteca.

Respeito à cultura

Contudo, quanto ao templo localizado no meio da floresta, é perceptível o respeito dos autores pela civilização maia no que tange artefatos, monumentos e esculturas. Mesmo estando alguns milhares de quilômetros do local original.

Fica bem evidente também o respeito da obra a cultura amazônida, ao clima, as paisagens e aos costumes. Noutros momentos chama a atenção para a fauna e flora, como quando o navio embarcado por Mister No, fica preso em meio às tapaias e quando Dana Winter é atingido por um dardo de uma zarabatana embebido em curare. Em diversos trechos, o narrador descreve com grande precisão as mudanças climáticas diárias da região.

Em Manaus, Amazonas, quando chove, a coisa é pra valer, gente! O céu fica coberto de repente por densas nuvens, que envolvem toda a região com uma capa plúmbea, descarregando então  uma avalanche d’água antes mesmo que se tenha tempo de procurar abrigo!

E as pessoas? Dirão vocês. Bem, as pessoas estão habituadas. Aceitam a coisa com a tradicional filosofia sul-americana e esperam… esperam que a incrível cortina líquida se dissolva e se preparam para suportar a inevitável consequência do retorno do sol e do calor, um calor tão úmido e debilitante a ponto de tolher a força de mover um dedo.

Outras edições

Ao longo de sua vida editorial, “Mister No” teve diversas outras história pela amazônia, passando por Manaus, Parintins, Belém e Santarém. Numa das histórias, Jerry encontra um “fantasma” no Teatro Amazonas, uma referência clara ao Fantasma da Ópera. 

Outras histórias de Mister No:

 


Infelizmente a revista deixou de ser publicada em dezembro de 2006, após Bonelli declarar que todas as aventuras possíveis dele já haviam sido lançadas. O autor já revelou em entrevistas sua paixão pelo Brasil e as viagens para o Pantanal e para a Amazônia para coletar informações, o que explica a riqueza de detalhes. Só nos resta agora nos deleitarmos com as edições existentes e nos divertirmos com essas histórias que homenageiam nossa terra.