Hoje é daqueles dias em que eu me emociono por fazer parte deste blog. Não apenas pela oportunidade de falar sobre as coisas que gosto. Poder falar com alguém que admiro é magnífico, surreal. O cara já fez várias coisas nessa vida e escreveu um livro que sou louco pra ler.
Christopher Kastensmidt nasceu nos EUA, mas mora em Porto Alegre desde 2001. É autor de prosa, quadrinhos e poemas publicados em doze países. Sua obra mais conhecida é o mundo ficcional A Bandeira do Elefante e da Arara, cujas histórias renderam para ele o prêmio da revista Realms of Fantasy e uma indicação do prestigioso Prêmio Nebula. Participou da criação de trinta games, totalizando milhões de unidades vendidas, e chegou a ser Diretor Criativo da Ubisoft Brasil. É palestrante frequente em eventos nacionais e internacionais. Leciona na UniRitter, nos cursos de jogos digitais e letras.
A Bandeira do Elefante e da Arara segue Gerard van Oost – holandês – e Oludara – do reino de Ketu – nas suas aventuras através de uma versão fantasiosa do Brasil do século XVI. O livro contém dez aventuras interligadas da dupla, que passa por toda a colônia da época, desde Olinda a São Paulo. Nas suas jornadas, Gerard e Oludara encontram-se frente a frente com diversas populações e grupos da época, desde goitacás e tupinambás até jesuítas e bandeirantes. No seu caminho ficam à espera criaturas perigosas, caçadores de seres humanos, como o aterrorizante Mapinguari e o invulnerável Capelobo. Porém, não são todos os seres sobrenaturais malignos, e para sobreviver, Gerard e Oludara terão que buscar alianças inesperadas. O livro culmina em uma batalha catastrófica que decidirá o futuro não apenas dos protagonistas, mas de toda a colônia.
MN: Qual a inspiração para obra?
Chris: Posso citar várias inspirações, desde as leituras de fantasia e mitologia da minha infância (Fritz Leiber, J. R. R. Tolkien, Stephen R. Donaldson), até as aventuras de Hans Staden, mercenário alemão que visitou o Brasil duas vezes no século XVI. Só vim para o Brasil pela primeira vez em 1997, já adulto, e me encantei com a cultura e história do país. Comecei a escrever profissionalmente em 2004 e tive a ideia de ambientar alguma obra de fantasia no Brasil no final de 2006, já com uma década de bagagem cultural na mão.
MN: Quanto tempo você levou trabalhando nela?
Chris: Levei um pouco mais de sete anos pesquisando e escrevendo as histórias que compõem o romance. Fiz muitas outras coisas durante este período, claro. Nasceu meu filho, fiz mestrado, vendi um estúdio de games para Ubisoft, trabalhei como professor de jogos digitais, participei de um monte de outros projetos, mas durante este tempo, nunca parei de trabalhar na série. Tentei “pintar” a época da maneira mais fiel possível, dentro das fontes disponíveis, e utilizei cerca de 200 livros na minha pesquisa.
MN: Qual o retorno que o público lhe deu e como é seu contato com os fãs?
Chris: O retorno tem sido altamente positivo. As histórias já foram traduzidas para vários idiomas. Tanto as histórias quanto a adaptação para quadrinhos já concorreram a prêmios importantes. No Brasil, os livros já foram adotados em dezenas de escolas, e palestro para milhares de alunos por ano. Para dialogar com os fãs, tenho um newsletter, o site da série, uma página no Facebook e contas no Twitter e no Instagram. Assim, o leitor pode escolher o meio da sua preferência.
Quem cuida de todas estas postagens atualmente é o Victor Batista, que trabalha comigo, já que não tenho mais condições de fazer tudo isso e ainda produzir alguma coisa. Mas quando alguém manda uma mensagem, eu que respondo. Antigamente, recebi poucas comunicações, mas hoje em dia, há pessoas entrando em contato toda semana para elogiar os livros. Sempre fico honrado quando alguém toma seu tempo para entrar em contato comigo. Dá muito orgulho todas estas conquistas da série, sem dúvida.
MN: Como você reagiu com cada tradução que o livro teve?
Chris: As primeiras traduções eu que busquei. A série começou em forma de contos, sem maiores pretensões comerciais, onde é normal o autor mandar para revistas estrangeiras. Por isso, as primeiras histórias saírem em lugares como RealmsofFantasy, StarShipSofa e Pevnost. Depois de lançar a série de forma comercial (em português através da Devir e em inglês através de uma edição minha) e atingir certo nível de sucesso, as editoras estrangeiras começaram a me buscar para licenciar direitos de distribuição. Fui realmente chocado quando a DoubanRead, rede social chinesa com 100 milhões de usuários, entrou em contato comigo para vender os livros na China. Em breve, vem uma edição pela Sportula, na Espanha. De novo, cada pedido é uma honra para mim.
MN: O que pode falar sobre projetos futuros?
Chris: Terminei no ano passado um jogo de tabuleiro baseado nas personagens e situações do romance, com arte de SulaMoon. Creio que ele deva sair no meio deste ano. Também tive o prazer de anunciar que lançarei, mais uma vez em parceria com a Devir, um livro de RPG baseado na série. Este livro vai ser direcionado principalmente para alunos, com um sistema simples e bastantes dados históricos e culturais que podem ser trabalhados em sala de aula. Confirmado para lançamento no segundo semestre de 2017. É um dos projetos que mais me empolga em todo este universo ficcional. Os jogos de RPG de mesa foram uma grande influência na minha adolescência.
MN: Sobre a literatura brasileira contemporânea, há alguma indicação que gostaria de deixar para quem curtir seu livro e quiser ler algo parecido?
Chris: Para quem gostaria de ler algo ambientado especificamente no Brasil, tem as histórias de Saga de Tajarê, por Roberto de Sousa Causo, aventuras mágicas na época pré-colonial. Para os leitores mais jovens, há a brilhante série Os Sóis da América, de Simone Saueressig. Para uma época completamente diferente, recomendo as histórias steampunk do mundo Brasiliana Steampunk, de Enéias Tavares. Para mais histórias de espada e feitiçaria, tem os livros do Espadachim de Carvão, de Affonso Solano, ambientados no seu mundo de Kurgala — atualmente estou traduzindo-o para inglês — e Os Contos do Cão Negro, de Cesar Alcázar, ambientados na Irlanda medieval.
Kastensmidt foi um fofo e terminou a entrevista com um “Muito obrigado pela oportunidade. Gosto muito do trabalho que vocês estão fazendo aqui no Mapingua Nerd”. Sinceramente, sou eu quem tem que agradecer. Se ficou animado com a notícia sobre um RPG no futuro, aguarde por novidades na minha coluna. Até mais e obrigado pelos peixes.