Stanley Martin Lieber, mais conhecido como Stan Lee, é uma das figuras mais conhecidas na indústria das histórias em quadrinhos, não apenas nos EUA, mas em todo o mundo. Foi editor da Marvel Comics e ajudou a criar, junto de lendas como Jack Kirby e Steve Ditko, os heróis que hoje tomaram conta da cultura pop. Lee faleceu em 2018 e deixou um legado gigantesco ao lado de outros criadores. Agora, um grupo de artistas amazônidas também faz parte deste legado. Vamos conhecer Death Hunt!
O primeiro volume da HQ Death Hunt foi lançado durante a CCXP 2022, para o app de streaming de quadrinhos Social Comics. A realização do projeto se tornou possível por meio da parceria entre a produtora americana POW! Entertainment e a brasileira Eleven Dragons e conta com roteiro de Ademar Vieira, supervisão de roteiro de J.P. Sette, arte de Rick Troula, cores de Tai Silva e edição de Sâmela Hidalgo.
A história de Death Hunt se passa na Amazônia dos dias atuais. John Cord, um policial de Nova Iorque, tem seu irmão, o ambientalista Brent, desaparecido em circunstâncias misteriosas, enquanto investigava um garimpo ilegal, localizado nas terras de um povo indígena, que há muito tempo se isolou do contato com o mundo exterior. Cord chega a Manaus e descobre que uma amiga de Brent, Niara, uma jornalista de origem indígena, está investigando o caso por conta própria e é nesse contexto, que uma trama cheia de reviravoltas, suspense, ação e ficção científica se desenrola.
Além da trama se desenrolar na Amazônia, o projeto se destaca pela participação de artistas nortistas. Por isso, chamamos Sâmela e Ademar para falar um pouco mais sobre como foi trabalhar na produção de Death Hunt.
Sâmela Hidalgo
Você já trabalha com edição de quadrinhos há um tempo, inclusive com títulos de grandes nomes internacionais. Conduzir o processo editorial de Death Hunt foi diferente? Por quê?
Sâmela Hidalgo: “Foi muito diferente. Primeiro porque foi o primeiríssimo projeto em que eu acompanhei literalmente todos os passos desde o comecinho e pude encaminhando do jeitinho que idealizei. E também tive total liberdade pra criar e gerenciar tudo. Desde palpites no roteiro, na arte, na escolha da equipe, na criação dos extras e tudo mais. Segundo porque tem um valor sentimental pra mim, por ser ambientado na Amazônia. Tem um gostinho de ‘produzido no polo industrial de Manaus’ igualzinho a mim! E isso me fez sentir cada vez mais próxima de casa e das minhas raízes. E de poder trazer a voz de artistas amazônidas pra contar essa história de uma forma que somente nós mesmos poderíamos contar.”
Já se fala da preservação da Amazônia há bastante tempo, mas recentemente o assunto se tornou uma das principais pautas da comunidade internacional. Como foi o processo de produção dessa história enquanto a floresta aparecia como palco de cenas e acontecimentos marcantes como as mortes do jornalista britânico Dom Phillips e do indigenista brasileiro Bruno Pereira?
Sâmela Hidalgo: “Quando começamos a destrinchar o texto do Stan Lee e transformar em roteiro, foi no momento em que muitos desses conflitos na Amazônia passaram a tomar os jornais. Até comentamos que o roteirista da realidade estava ultrapassando a ficção. E aí foi que decidimos usar esse espaço artístico pra introduzir temas reais que estavam acontecendo nesse momento na Amazônia. Passamos a buscar matérias e ficar de olho nas notícias pra implementar no roteiro como uma forma de denúncia mesmo e de dar um foco maior. Até porque isso era muito importante pra gente numa equipe onde há artistas amazônidas e indígenas, poder trazer à tona essas barbaridades que acontecem literalmente no nosso quintal e que resultam em desmatamento e morte.”
Que cuidados vocês tiveram para retratar a região amazônica?
Sâmela Hidalgo: “Como gosto de dizer, não existe Amazônia sem os amazônidas. O primeiro passo foi simplesmente trazer pessoas da região amazônica e indígenas pra ajudar a contar essa história. Ninguém mais que nós, que vivemos na região, pra falar sobre isso. Por isso a escolha do autor manauara Ademar Vieira pra ser o roteirista e da artista indígena belenense Tai Silva. Além de também poder contar com a leitura sensível do roteiro feita pela autora indígena manauara Jamile Anahata. Até mesmo da participação especial do ilustrador Keoma Calandrini, do Pará, pra compor uma cena ilustrada alternativa que tem no final da HQ. Além de nossas próprias vivências, também tivemos muita pesquisa.”
Ademar Vieira
Mesmo sendo uma figura que já gerou muitas controvérsias, Stan Lee é inegavelmente uma das grandes cabeças da Marvel e da indústria norte-americana. Como foi pra você trabalhar a partir de um argumento dele?
Ademar Vieira: “Bem, depois de passar o impacto inicial de ter sido escolhido para esse trabalho, eu tive que fazer o esforço de não me sentir pressionado pelo peso do nome do Stan Lee. Para minha alegria, tanto a Pow! Entertainment quando a equipe da Eleven Dragons, estavam dispostas a abrir mão de muita coisa do argumento original, se fosse pelo bem da história. Eu não sei em que momento da vida que o Stan Lee escreveu Death Hunt, mas tivemos que mudar algumas coisas para deixar a história mais atual e dar a ela uma relevância maior, trazendo discussões bastante sérias sobre o tema Amazônia.”
Conte (o que for possível contar) sobre o que podemos esperar da realidade amazônica na história.
Ademar Vieira: “Os últimos quatro anos foram os piores em termos de retrocesso das questões ambientais e indígenas na Amazônia. Garimpos ilegais; queimadas; exploração madeireira ilegal; invasão de grileiros e garimpeiros a terras indígenas; conflitos armados e até mesmo assassinatos de ambientalistas, então, a gente não podia falar da Amazônia ignorando tudo isso. Na trama, o irmão do policial John Cord é um ambientalista que desaparece após investigar um garimpo clandestino em terras indígenas. Mais tarde, Cord descobre que aquele garimpo era apenas a parte visível de toda uma organização criminosa na Europa, que obtinha lucros exorbitantes por meio da exploração e destruição do território indígena.”
A HQ, que contará com seis volumes, será publicada inicialmente em formato digital e também traz Greg Tochinni, de “Thor Sons of Asgard” da Marvel, como capista. O primeiro volume já está disponível na plataforma Social Comics.
Até o próximo papo!