Algumas histórias em quadrinhos de super-heróis são publicadas em um arco fechado, com uma história com início e fim, e que pertence apenas àquele universo de uma ou poucas edições. São as chamadas “graphic novels”, e nelas nasceram grandes clássicos.
Com a expansão do sucesso de filmes de heróis e de toda a grandeza milionária que a Marvel Studios conseguiu arrecadar quando fez o seu universo cinematográfico compartilhado no cinema, não era de se surpreender que a Warner, em parceria com a DC Comics, tentaria o mesmo. Não se pode nem dizer que o tiro da Warner saiu pela culatra. Na verdade, eles pegaram a própria arma e atiraram consecutivamente contra o próprio pé.
O universo cinematográfico compartilhado da DC Comics no cinema foi por água abaixo. Agora, imagine que, assim como nos quadrinhos, existisse um filme que fizesse parte apenas do seu próprio universo e que não precisasse estar em conexão com outra dúzia de filmes. Assim nasceu Coringa, e assim nasceu um novo clássico do cinema de herói.
Como qualquer gênero já estabelecido no cinema, os filmes de heróis começaram a seguir uma fórmula repetitiva, no qual garantiam o sucesso e poucas novidades eram mostradas em tela. Claro, algumas exceções surgiram, como Logan, Pantera Negra e Vingadores: Ultimato.
Ao anunciarem Joaquin Phoenix como novo Coringa, logicamente levantou-se muitas suspeitas que um novo filme de um novo Coringa, ainda tão próximo do fracasso de críticas que foi o Coringa de Jared Leto, seria um filme ruim. Ao ser revelado o primeiro trailer, as suspeitas foram diminuindo, e ao revelarem a reação do público no Festival de Cinema de Veneza, as suspeitas caíram drasticamente e o hype finalmente começou a surgir.
Em duas horas de filme, Todd Phillips cria uma atmosfera dos anos 80 de uma Gotham ainda não muito explorada nos cinemas. Joaquin Phoenix dá a luz, com maestria, a Arthur Fleck, um aspirante a comediante que trabalha como palhaço.
Arthur sofre de uma condição, na qual em situações traumáticas e de estresse, ao invés de mostrar reações como o choro, ele começa a dar altas gargalhadas e não consegue, de maneira alguma, segurar o riso. São nessas situações de risadas histéricas que Joaquin Phoenix mostra toda a beleza de sua performance, onde a gargalhada e o riso existem, mas o seu olhar é sempre triste e desesperador.
A trilha sonora carrega um clima sombrio e ajuda a criar o suspense. É normal que muitas pessoas passem a sentir pena de Arthur devido a acontecimentos que marcam o seu cotidiano, mas ao despertar como Coringa, cenas marcantes chegam à tela, onde muitas delas são carregas de puro suspense, onde o público fica tenso imaginando aonde tudo aquilo vai parar.
Os caminhos tomados pelo filme, algumas vezes, chegam a ser surpreendentes. Nessa jornada do palhaço do crime, até que Arthur se caracterize inteiramente como Coringa, demora um pouco, mas quando chega… não é nada desanimador.
Em algumas cenas do longa, cheguei a realmente me pegar surpreso com o que eu via em tela. A crueldade e o pessimismo de Arthur de maneira alguma passam em branco, e quando o mesmo decide por tomar suas decisões e cometer os crimes, é de se chocar a crueza como tudo aquilo é mostrado em tela.
As cores, a trilha sonora, o clima, ambientação e maquiagem do filme agregam, e muito, ao clima estabelecido pelo diretor para contar essa história. Os detalhes do filme não passam despercebidos. Sejam detalhes em grande escala, como a influência do palhaço do crime na sociedade, ou em escalas menores como o fato de Arthur nunca remover sua maquiagem de palhaço completa no início do filme (a final, ele não tem ninguém para se preocupar em avisar que não se limpou direito). Ou até mesmo a escadaria que Arthur segue até chegar no prédio em que mora, que sempre sobe desanimado como Arthur, mas quando desce como Coringa a sua perspectiva é outra.
Coringa é um grande marco positivo, não só para a Warner e DC Comics, mas também ao cinema de super herói, pois abre portas para outras produções ganharem vida nas telonas testando até onde é possível levar novidades dentro desse gênero para o grande público. Ainda existe muito hype envolvido a possíveis indicações de Coringa ao Oscar, mas uma coisa é certa, com indicação ou não, Coringa já se tornou um clássico que será sempre lembrado como um ótimo filme.