“Vários dias se passaram desde que Atelith e Ranemann se distanciaram de seus lares em busca do último fragmento conhecido do Fôlego da Redenção. Atravessando o Deserto de Clahtemariaeh – onde conseguiram escapar dos escorpiões de areia servos do deus Clãh – desceram o planalto escaldante fronteiriço à estrada demolida (chamada Malem – que significa “abandonada” em acheronian médio) que leva ao seu objetivo: a Floresta Escura. Outrora chamada de Bosque Abençoado de Bel” e hoje recoberta por trevas impenetráveis, tal lugar cheio de perigos belicosos aos viajantes neófitos é a morada de demônios e criaturas amaldiçoadas desde o fim da Era dos Profetas do Caos, quando o deus dragão Draemoniach se refugiou ferido de morte com o restante de suas hostes nas cavernas que formam o complexo subterrâneo do lugar após a Grande Guerra dos Míticos Alados. ” – As Crônicas de Acheron – Da queda de Ranemann e o surgimento da Floresta Escura.

Me senti como Gandalf, soprando a poeira de antigos pergaminhos entre os arquivos da grande biblioteca de Minas Tirith, ao me deparar com as primeiras linhas de As Crônicas de Acheron. Repletas de personagens em aventuras épicas, que surgem e desaparecem sem serem sequer apresentados. Um mundo feito de quebra-cabeças, a ser montado a cada página virada. E a sensação de estar lendo não uma história de ficção, mas registros documentais de uma época perdida. Centenas deles.

wallpaper-2525922(Não consegui descobrir o autor da arte. Se souber, comente)

A gênese do autor

As Crônicas de Acheron é como Antonio Vasconcelos II – professor universitário de 36 anos – chama a infinidade de histórias escritas ao longo de décadas de imaginação fértil alimentada por muita leitura, principalmente fantasia e horrror.

“Sempre fui ávido leitor” – conta – “Na infância e adolescência já tinha uma espécie de diário onde anotava de tudo: frases soltas, esquetes de coisas que aconteciam, poesias, desenhos etc. E aí apareceram as máquinas de escrever, e finalmente os computadores e a Internet. Teve época que mantinha dois blogs, um sobre música erudita e outro sobre tudo o mais que me desse na telha. A essa altura eu já tinha laptop e algum tempo livre. Então surgiram contos de horror, poesias… e Acheron.”

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“Em 2008 acabei enviando material para um concurso de novos talentos escritores do SESC e para minha surpresa fiquei em primeiro lugar! Havia enviado dois textos, por insistência de terceiros, e o conto escolhido foi justamente o que eu achava que tinha as menores chances de ser selecionado. Esse evento me fez refletir sobre meu material. A pergunta que todo mundo que escreve faz – quem se interessaria em ler isso? – foi meio que respondida com esse evento. No ano seguinte participei mais uma vez e tive um conto selecionado para entrar na antologia de 2009.”

Mestre em Ciências Odontológicas e especialista em Estomatologia, Antonio também publica conteúdo na área. “Atualmente minha ‘verve ecriturística’ está concentrada em terminar o capitulo de Biópsia e Citologia Esfoliativa de um livro de Estomatologia do qual sou colaborador”, conta o professor da UEA e Uninorte.

Ainda assim, ele não se considera escritor. “Acho que a palavra ‘escritor’ define um perfil no qual não me enquadro. Ora, eu não ganho dinheiro algum com as coisas que escrevo. E nem me relaciono com o ato de escrever de maneira pragmática. O hábito veio como uma consequência de observar as coisas que acontecem ao meu redor.”

Influência de grandes mestres – de Tolkien a Shigeru Miyamoto

Entre essas coisas, estão também as obras que ele consome. Perguntado sobre quais obras influenciam As Crônicas de Acheron, Antonio cita desde textos sagrados e grandes autores a videogames:

  “Eu diria que a estruturação de Acheron se perfaz em uma estilística de ares ‘bíblicos'” 

“A maneira como Moshe relata os eventos fantásticos da criação do mundo (na Torah), as aventuras dos patriarcas e a relação deles com o divino foram fontes de inspiração para um livro pelo qual tenho grande apreço: O Silmarillion. Eu diria que a estruturação de Acheron se perfaz em uma estilística de ares “bíblicos”. E sim, existe um maniqueísmo latente em seus personagens. Não consigo fugir das coisas que me enchem os olhos. Já perdi há muito tempo a contagem de quantas vezes li sobre a Dagor Bragollach. Cada página do Silmarillion é um compêndio de proporções tsunâmicas na mente de todo apaixonado por literatura fantástica. Tolkien foi ditatorial em sua beleza épica descritiva ali. Mas ele certamente se manteve fiel aos seus ditames cosmogônicos quanto aos aspectos narrativos os quais se ateve para desovar o livro sagrado da Terra-Média.”

“Eu também tenho que abrir um breve parêntese para dizer que, apesar de improvável, Lovecraft também está em Acheron. Não sei se consigo ser o que penso quando vejo o Caos em movimento nos meus rabiscos, por exemplo, a não ser a imaginação do transcendente arcano que Lovecraft imprime em seus mitos de Cthulhu. O psicologismo do Cavalheiro de Providence é algo que tenho até vergonha de observar com um olhar propriamente desnudo de sentimento, mas arremedos de sua obra são certamente força motriz quando a podridão tentacular de Acheron se alastra na minha imaginação.”

shadowed_land_avathar_by_grrrodSilmarillion é uma das inspirações para As Crônicas de Acheron – Arte: Gordon Theobald

“Poderia, por fim, também citar Mirolad Pávitch com seu Dicionário Kazar. As narrativas elegantes e inusitadas dos embates filosóficos a respeito das religiões e o misticismo simbolista contidos nesse livro estonteante explodiram minha mente aos doze anos. De tal forma que o bom humor de certas histórias, como a do demônio Sevast, me fizeram perder horas de sono imaginando o universo Kazar e suas sutilezas tão requintadas e discretas todas as vezes que revisitava a obra ao longo de minha adolescência. Com certeza o enigmático de Acheron chega às fronteiras Balcãs.”

   “Acheron sempre existiu em mim. (…) como a história que eu gostaria de ter lido”

“Acheron sempre existiu em mim. Enquanto jogava The Legendo of Zelda, Dragon Quest, Final Fantasy… Durante a minha infância. Ela já estava lá em algum lugar durante meu período formativo. Daí para começar a transcrevê-lo foi um tempo que só a leitura e a reflexão me proporcionaram até meados de 2007, quando eu vi o Caos em movimento pela primeira vez em um cochilo dentro do ônibus que me levava a Manacapuru numa noite de domingo. Daí para o meu caderno de anotações foi um pulo.”

“Acheron é uma versão beta do que eu sempre fico retomando como a história que eu gostaria de ter lido de terceiros. É um mundo que eu gordurosamente lustro com meus incômodos a respeito do que me inquieta em um mundo tão fantástico quanto as minhas influências podem me proporcionar.”

Publicação será gratuita

Após quase uma década sendo escritas, As Crônicas de Acheron serão finalmente publicadas. E o melhor: de graça. Antonio, que também assina a coluna “Memórias de um Old Gamer” aqui no blog, concordou em publicar sua obra, de forma exclusiva, aqui mesmo no Mapingua Nerd!

Portanto, toda quarta-feira, a partir de amanhã, você vai embarcar em uma viagem ao mundo fantástico de Acheron, em uma nova crônica. Se você é fã de literatura fantástica, não pode perder!